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  • Foto do escritorMaria Paula Veríssimo Carrera

O TRABALHO ESCRAVO NA MODA

Atualizado: 28 de jan. de 2022

“estamos todos conectados ao trabalho escravo contemporâneo”

(Leonardo Sakamoto; Repórter Brasil)


Estima-se que cerca de 45,8 milhões de pessoas vivam em condições de escravidão no mundo, 55% são mulheres e 26% crianças (Fonte: Fundação Walk Free). A escravidão como contada nos livros de história foi abolida, mas a verdade é que ela não foi, de fato, eliminada, apenas tomou novas formas.


(Chico Max | Reprodução)



== O que configura escravidão moderna?


De acordo com o Artigo 149 do Código Penal, são elementos que caracterizam o trabalho escravo: condições degradantes (aquelas que excluem o trabalhador de sua dignidade), jornadas exaustivas (que impedem a sua recuperação física e a manutenção de uma vida social), trabalho forçado (manter a pessoa no serviço por meio de fraudes, isolamento geográfico, retenção de documentos, ameaças físicas ou psicológicas) e servidão por dívida (fazer o trabalhador contrair ilegalmente uma dívida e prendê-lo a ela).


Muitas vezes, o próprio trabalhador não consegue compreender que está sendo escravizado.


“Quando a gente pensa escravo vem na nossa cabeça o que aprendemos na escola, escravo é o negro acorrentado. Elas não se veem nessa situação. Não estão acorrentadas, não são agredidas fisicamente, tem ali alguma liberdade para sair fisicamente da oficina. Assim, a pessoa tende a achar que o problema é ela mesma, que é ela que não tem conhecimento suficiente pra ter outra vida, e que o único caminho para ter uma vida melhor é trabalhar ainda mais” (Chico Max; mostra fotográfica “Costurando Dignidade”, 2019)


Ou seja, a escravidão moderna se manifesta como diversas formas de exploração e abuso nas condições de trabalho em vários setores, inclusive na Moda.



== Reações ao trabalho escravo moderno na indústria da Moda


As reações aos abusos nas condições de trabalho na indústria têxtil tem uma longa história intimamente ligada a atos de mulheres operárias.


Como exemplo icônico, no dia 08 de março de 1857, operárias de uma indústria têxtil em Nova York fizeram greve em busca de melhores condições de trabalho e igualdade de direitos trabalhistas. As operárias tinham uma carga horária de 16 horas por dia e ganhavam em média 3x menos que os homens, desempenhando o mesmo trabalho. A manifestação foi reprimida, as mulheres trancadas dentro da fábrica, que foi incendiada. Aproximadamente 130 tecelãs morreram.


Diversos outros atos ocorreram no decorrer da história. Para mais informações, você pode conferir nosso post do blog sobre o Dia da Mulher.


Em data mais recente, no dia 24 de abril de 2013, o edifício Rana Plaza, prédio em Dakha, capital de Bangladesh, desabou. Mais de 1.100 trabalhadores do setor de confecção morreram e mais de 2.500 ficaram gravemente feridos. As vítimas trabalhavam em condições análogas à escravidão produzindo roupas para marcas conhecidas no mundo todo, como Benetton, Mango e Primark.


Logo após o desabamento do Rana Plaza, Carry Somers e Orsola de Castro fundaram o Fashion Revolution, um dos movimentos de maior importância na conscientização acerca da escravidão moderna na indústria da Moda.


O movimento tem o objetivo de gerar conscientização sobre os “impactos socioambientais do setor da moda; celebrar as pessoas por trás das roupas; incentivar a transparência e fomentar a sustentabilidade”. O Fashion Revolution traz as seguintes perguntas - “Quem fez sua roupa?”, “Quais os materiais utilizou?”, “De onde eles vieram?”, “Como estas peças foram feitas?”.


Você conseguiria responder?


A exposição dos fatos faz com que as pessoas passem a ter mais consciência de si e do papel que desempenham no mundo. As marcas percebem o quão prejudicial é serem associadas ao trabalho escravo e infantil, seja por empatia e respeito ao outro ou meramente por dinheiro. Fato é que quando o consumidor se expressa com a carteira, o mercado tende a ouvir.


O caso mais representativo é o da Nike. Em 1991, veio à tona informações de que funcionários de confecções na Indonésia que forneciam para a marca, recebiam 14 centavos de dólar por fora. O caso repercutiu no mundo todo, inclusive nas Olimpíadas de Barcelona em 1992. Em 1997, as ações da empresa caíram quase 40%. Em 1998, suas vendas caíram 8% devido à boicotes (Fonte: ABVTEX). Como consequência a Nike anunciou medidas como aumento de salários, intensificação da fiscalização nas oficinas e o aumento do nível de pureza do ar nas fábricas da Ásia para padrões americanos.

A Nike, em 1998, gastou mais de 1,1 bilhão de dólares para promover a reputação de seus produtos. De 2002 a 2004, fez 600 auditorias em fábricas e, em 2005, tornou-se a primeira empresa do setor a tornar pública sua lista de fornecedores, condições de trabalho e salários na sua cadeia de produção (Fonte: ABVTEX). A situação foi revertida mas até hoje sua história é manchada, como registrado inclusive nesse texto.


No Brasil, a ocorrência que teve mais projeção foi a da rede de lojas Zara (Inditex). Em 2017, a empresa foi responsabilizada por irregularidades encontradas em agosto de 2011 em oficinas subcontratadas. Segundo a acusação, 15 bolivianos e peruanos trabalhavam em ambiente insalubre, com uma carga horária de 15 horas diárias com um salário de R$2,00 por peça costurada.


Em contraponto, grandes multinacionais como C&A (holandesa) e Adidas (alemã), receberam em 2017 o prêmio Stop Slavery, da Fundação Thomson Reuters. Elas realizam auditorias rigorosas nos fornecedores a fim de avaliar diversos critérios como a presença de saída de emergência nas oficinas, ventilação adequada e se funcionários e subcontratadas possuem carteira assinada, entre outros. “Fazemos tudo dentro de casa porque queremos assegurar o mesmo padrão internacional de monitoramento. Não achamos que vale terceirizar essa responsabilidade”, diz Maraike Wegner, gerente de sustentabilidade da Adidas Brasil.


Mas, porque estima-se então que no Brasil ainda existam 369 mil escravos modernos, incluindo o setor da moda? (Fonte: Fundação Walk Free, 2016).

== Porque a escravidão se mantém?


Infelizmente, muitos consumidores ainda valorizam os preços baixos. Muitas vezes por necessidade, é fato. No entanto, na maioria das vezes não. Grande parcela compartilha a lógica da “quantidade acima da qualidade”, disposta a pagar pouco custe o que custar. E os custos são altos - o planeta e a vida das pessoas envolvidas no clico de produção.


A falta de rastreabilidade na produção da indústria da moda cria um cenário onde driblar leis trabalhistas torna-se fácil. Não é a toa que a moda é o segundo setor que mais explora o trabalho forçado no mundo. (Fonte: Fundação Walk Free, 2018).


As grandes empresas contratam uma longa cadeia de fornecedores, estes terceirizam seus serviços, contratando outros fornecedores que muitas vezes estão em locais irregulares e não possuem capacidade financeira para que suas operações sejam feitas minimamente de forma adequada. Dessa forma, as grandes marcas se eximem da responsabilidade do pagamento de direitos trabalhistas e encargos fiscais de forma a aumentar a margem de lucro.


Não tenha dúvida, na ponta da cadeia, estão pessoas pobres, marginalizadas, em situação de refúgio e, também, crianças.



(Chico Max | Reprodução)

== O que podemos fazer para ajudar?


Tomarmos consciência do problema e entender que nós somos parte dele!


Enquanto consumidores podemos pressionar empresas e governos para uma cadeia de produção mais transparente, leis mais justas e punições mais severas. Se informe e questione! Nossa maior munição é o conhecimento. Compre de marcas transparentes. Se não sabe a origem do produto, não compre! É possível encontrar marcas conscientes que estejam dentro do que o seu bolso pode pagar, te garanto!


O aplicativo de celular “Moda Livre”, da ONG Reporter Brasil avalia as medidas que as principais empresas de moda brasileiras adotam a fim de combater o trabalho escravo, bem como o conhecimento que elas têm da sua própria cadeia de produção. Consulte e veja se as marcas que costuma usar estão bem pontuadas. Se não encontrar, entre em contato com a marca a fim de obter informações.


Dê preferência para produtos com selos certificados, como ABVTEX, ORGÂNICO BRASIL, INSTITUTO ALINHA, PETA, entre tantos outros, que garantem uma compra limpa.


Afinal, é possível ser feliz pagando pouco por uma peça que foi feita ao custo da vida de uma pessoa ou a infância de uma criança??

== Casos de trabalho escravo flagrados no Brasil


Amissima

Animale

A. Brand

Cotton Colors

Brooksfield Donna

Renner

M. Officer

Bo.Bô

Le lis Blanc

Dentre outras.


Para mais informações, acesse o app Moda Livre.



Referências:


https://modalivre.org.br/


https://alinha.me/


https://www.fashionrevolution.org/brazil-blog/o-que-voce-precisa-saber-sobre-trabalho-justo/


https://www.cartacapital.com.br/blogs/fashion-revolution/escravidao-nada-moderna-como-a-moda-pode-ajudar-a-combater-o-trabalho-escravo/


https://www.cartacapital.com.br/blogs/fashion-revolution/trabalho-escravo-na-industria-da-moda-em-sao-paulo/


https://www.abvtex.org.br/noticias/chega-da-moda-cafona-do-trabalho-escravo/


https://www.abvtex.org.br/


https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2016-05/escravidao-moderna-atinge-458-milhoes-de-pessoas-no-mundo


https://reporterbrasil.org.br/2022/01/maior-marca-plus-size-do-brasil-perde-na-justica-mas-nao-paga-trabalhadores-escravizados/


https://www.fashionrevolution.org/brazil-blog/como-a-transparencia-pode-ajudar-a-transformar-a-industria-da-moda/



Materiais para fazer download:


Índice de transparencia da moda 2022 -

https://issuu.com/fashionrevolution/docs/indicedetranparenciadamodabrasil_2021


Trabalho Escravo na Indústria da Moda em São Paulo -

https://sinait.org.br/arquivos/publicacoes/Publicacao_112.pdf


Global Slavery Index 2018 (Fundação Walk Free) - https://www.globalslaveryindex.org/resources/downloads/



Indicação de filmes e documentários:


Filme brasileiro - ‘7 Prisioneiros; Alexandre Moratto


Filme sobre o futuro da moda - ‘The Next Black’: https://www.youtube.com/watch?v=XCsGLWrfE4Y

Documentário sobre a cadeia de produção da Moda e o real custo das roupas - The True Cost; Andrew Morgan


Documentário sobre moda ética - ‘Do we change it?’: https://www.youtube.com/watch?v=BMisBIlRmB4

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